Eu me lixo e qual o preço disso?

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No último domingo, estive em um encontro entre duas ONGs em um projeto que busca a discussão de problemas sociais e a promoção de soluções pelos jovens participantes de duas comunidades cariocas. Dentre os problemas levantados, esse ano ganhou destaque a questão do lixo. Esse é um problema antigo que diz a respeito a todos os moradores não só da população moradora dos morros, mas a toda a humanidade, que sofre de forma desigual as consequências dos resíduos produzidos. “Desigual” em um sentido porque nem sempre o lixo produzido por uns retorna ao próprio produtor – pelo menos, não tão rápido. Alguns podem simplesmente cruzar o corredor do seu condomínio e despejar seus restos por uma porta sem nem ao menos saber como e para onde vão aquelas embalagens de alimentos e produtos de limpeza misturados à matéria orgânica. Já outros tem que cruzar um espaço maior para fazer o mesmo. A diferença é que o acesso aos locais e meios de descarte dos materiais de cada um é diferenciado, dando comodidade a uns e exigindo mais esforço de outros. A semelhança é que dos dois lados existem pessoas que não se preocupam com o que vai e o que pode acontecer com o seu lixo.

Ninguém é mal por não cuidar dos seus próprios restos. Assim como os problemas pessoais, ninguém quer lembrar do que já se passou, do que é descartável. Faltam políticas, programas de gestão e movimentos governamentais suficientes que incentivem os cuidados para a prevenção de acidentes – haja visto as enchentes cariocas fotografadas desde o século XIX. Insere-se nessa falta a educação ambiental com os resíduos e é exatamente durante o período de chuvas que o problema se agrava.

Em 1987, um famoso morro carioca sofreu um deslizamento que matou sete pessoas e deixou sete famílias desabrigadas. Não era simplesmente terra. Contribuiu para o desastre um acúmulo de lixo em um local desabitado e em processo de erosão. Já se faziam atividades e eventos que alertassem o perigo da alimentação da montanha de resíduos. Porém, foi um esforço praticamente em vão para o acidente que modificou a vida de alguns moradores. Alguns? Sim. O que você acha aconteceu depois disso? Nada diferente do que vemos após desastres hoje em dia: uma grande comoção inicial e, um tempo depois, todos esquecem ou se torna uma lembrança vaga.

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Fonte: Página “Felicidade filtrada” no facebook.

No meio de tantas tragédias todos os dias, a educação ambiental parece algo vago e a reciclagem, algo bonito de se fazer, como uma simples alternativa de reuso descartável, mas nada importante.

 

Como disse antes, as pessoas não são ruins. São acomodadas a essa situação, porém também adaptadas a ter que sair de casa todos os dias a fim de conseguir o dinheiro necessário à própria sobrevivência (a vida mesmo é deixada em segundo plano, após pagar todas as contas) e da sua família, para então voltar para casa, esperando pelo próximo dia. Nisso tudo, o lixo fica em último lugar na lista de preocupações diárias.

Ausência política existe, mas não podemos nos esquecer que quem nos representa um dia também foi um cidadão comum e, se hoje é indiferente aos problemas socioambientais ou comete crimes contra a própria população, é porque não recebeu a educação adequada e nem a punição necessária – que deveria ser bem maior à representantes do governo, visto que a escala de consequências dos seus atos é bem maior. Porém, no início do mês de abril de 2013, foi divulgada a notícia de que, a partir de julho desse ano, o morador ou turista que jogar um objeto no chão levará uma multa que variará de R$ 157,00 à R$ 980,00. A prefeitura do Rio de Janeiro está bem distante de ser modelo para alguma coisa, porém, apesar do atual prefeito não ser exemplo de “fazer para o povo”, tenho que afirmar que essa medida talvez traga alguma mudança no cotidiano da vida pública.

O que ninguém parece saber é que já existe uma legislação do estado do Rio de Janeiro para o caso de sujar as vias públicas.

 

Lei nº 3.009 de 13 de Julho de 1998

Art. 1º – Fica proibido o despejo de lixo e detritos em locais públicos.

§ 1º – Considera-se lixo, para o efeito do que determina este artigo, tudo o que não presta e se deita fora.

§ 2º – Incluem-se como locais públicos, para o mesmo objetivo: baías, rios, lagos, estradas, ruas, praças e logradouros, localizados no Estado do Rio de Janeiro.

Fonte: http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/228200/lei-3009-98-rio-de-janeiro-rj

 

E até medidas punitivas bem mais salgadas.

 

Art. 3º – A inobservância desta Lei implica a punição dos seus respectivos transgressores.

§ 1º – Cabe aos órgãos públicos fiscalizadores punir o transgressor com multas que variam de R$10,00 (dez reais) a R$3.500,00 (três mil e quinhentos reais) de acordo com o grau de infração, do seu autor e a reincidência.

§ 2º – O infrator que causar danos físicos a alguém responderá por sua ação, respeitada a legislação específica em vigor.

Fonte: http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/228200/lei-3009-98-rio-de-janeiro-rj

 

O fato é que ela parece nunca ter sido colocada em prática. Na política do “fazer porque vai chegar visita” das atuais prefeitura e governo do estado, de preparação para a chegada dos estrangeiros para assistir e participar da Copa e das Olimpíadas no Rio de Janeiro, acredito que a nova lei seja levada a sério.

Algo que também deve ser levado em consideração é a qualidade e a quantidade de cestos de lixos.  Sabendo-se da urgência ambiental dessa cidade superpopulosa, tal lixeira é visivelmente incompatível com o real tamanho dos resíduos que deveriam ser armazenados.  Fora que também há poucos lugares com lixeiras específicas para os diferentes tipos de materiais (vidros, plásticos, papéis, metais, orgânicos, pilhas e baterias ou, simplesmente, materiais úmidos e secos). Porém, não custa nada guardar dentro da bolsa aquela latinha ou papel de biscoito, não é mesmo?

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Convenhamos que eles tem um tamanho bem pequeno. Quem de vocês já viu alguém jogando de longe para não encostar-se à boca da lixeira?

O que não faz sentido, apesar da seriedade da questão do lixo, é ser aplicada uma multa tão alta, de 157 reais, para um salário mínimo que não chega a 1000 reais à grande massa dos trabalhadores. Não sendo, assim, a melhor forma, porém a medida em si talvez mude o comportamento das pessoas em relação aonde estão descartando os seus materiais. A população reagiu com estranheza e, provavelmente, haverá revolta por conta disso, quando a lei entrar em prática. O fato é que vai demorar muito ainda para a população passar da fase do “preservar pelo medo de pagar” para o “preservar porque é o correto”. Um hábito ou comportamento demora a ser inserido na cultura e no cotidiano de uma população e o resto do mundo não é diferente. Os países desenvolvidos que já chegaram a esse estágio passaram por um momento de “aprendizado” e hoje as pessoas não tem o cuidado pelo medo de uma multa, mas porque isso já virou um hábito.

Ainda bem que essa multa não vale para as comunidades de baixa renda, porém não descarto a possibilidade de algum tipo de multa, nem que seja por forma de trabalhos comunitários. É triste, porém só a educação e a conscientização ambiental não dá conta em evitar a sujeira. É necessária uma política que assegure a punição dos envolvidos.

E vocês? Acham que se deve multar quem joga lixo na rua?